Uma morte sem assistência no paraíso

Uma morte sem assistência no paraíso

Por Rodrigo Anjos

Turista de Alagoinhas morreu afogado neste domingo (22), em Imbassaí

Informações Correio24horas
Turista vela corpo em praia de Imbassaí (Foto: Roberto Gazzi)
Turista vela corpo em praia de Imbassaí (Foto: Roberto Gazzi)

É uma cena estranha, improvável, de cinema. Um corpo está ali, envolto num véu de berço, à sombra de um coqueiro, tendo ao fundo uma das mais belas paisagens do Brasil: o encontro do rio e mar em Imbassaí, no Litoral Norte da Bahia. Alguns turistas e uns moradores o velam. Alguém piedoso colocou uma barraca de praia patrocinada para proteger a cabeça do morto do escaldante sol das 14 horas. Por várias horas ele permaneceu ali, enquanto uma multidão brincava ali por perto, aproveitando o maravilhoso dia de sol. 

A história do corpo estendido no chão, para lembrar a música de João Bosco e Aldir Blanc, tinha começado uma hora antes. De repente uma aglomeração vai aumentando cada vez mais na beira da praia. Um homem está estendido na areia, dois outros tentam reanimá-lo, uma mulher está aos prantos, vários oram, rezam, pregam e outros acionam seus celulares em busca de ajuda. Ronaldo tinha vindo de Alagoinhas com a família para se divertir em Imbassaí. E não resistiu ao mar, mesmo tendo um médico entre os que tentaram garantir sua vida.
Tiago Duarte é um médico soteropolitano que trabalha no ABC paulista, mas está de férias na Bahia. Era um dos homens que tentaram reanimar Ronaldo. Ele diz que desde que tentaram acionar o resgaste, houve uma sucessão de erros: “Ligamos para o Samu, atendeu a base de Camaçari (Imbassaí pertence ao município de Mata de São João).  A base não tinha contato com a PM. Depois de meia hora chegou a equipe, sem médico. Chegou uma socorrista e um motorista, mas vieram sem equipamentos. Pedi um desfibrilador. Tiveram de voltar ao carro, voltaram, mas não conseguiram reanimá-lo”. Constatado o óbito, foram embora, assim como guardas rodoviários que tinham aparecido por lá. O máximo que o poder público fez foi levar a viúva Valnice, que passava mal, a um posto médico.
Sem ajuda, os banhistas se cotizaram: uma mulher emprestou o véu do carrinho de bebê, outro uma esteira. Com a ajuda do médico, o estabilizaram e o levaram para próximo da saída da praia, depois do rio. Sobre a sombra do coqueiro e a proteção do guarda-sol, o corpo lá ficou esperando a remoção.
“Aquele trecho da praia em que ele se afogou é perigoso, cheio de redemoinhos”, disse Mateus Costa, um morador local que aluga caiaques e stand-ups e que já teve de emprestar seus equipamentos para outros salvamentos. “Até uns meses atrás havia um postinho com salva-vidas ao lado das barracas de comidas, mas aí tiraram e não apareceram mais”. Apesar da multidão que acessa Imbassaí aos domingos, a praia além de não contar com salva-vidas, não tem nenhum aviso sobre trechos perigosos. Procurada, a Prefeitura de Mata de São João disse que somente na segunda-feira poderá se pronunciar sobre o ocorrido.
Se houver uma entrada no Paraíso, ela deve parecer Imbassaí, com seu rio, seu mar, matas e coqueiros.  Já era quase noite e Ronaldo permanecia naquele cenário espetacular, próximo ao rio e em frente ao mar que o matara.

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